Tuesday, February 24, 2015

o Amor tem...

O Amor tem de fazer cócegas.
Sempre.
Ainda que passado tempo e tempos, possa ficar mais morno e aconchegante, como uma "manta no sofá".
Ainda que o conforto traga a calma e a certeza próxima do companheirismo, da cumplicidade de quem já vive por cá. No nosso coração.
Na impermanência de tudo, de cada instante, de cada momento respirado, o conforto é rei, mas as cócegas querem-se sempre. O burburinho de quem suspira quando vê o outro chegar. Quando o vê entrar depois de se ausentar, ainda que diariamente, na rotina da vida a dois, da vida de cada um.
O Amor quer-se tesudo, sempre. Quer-se romântico e confortável. Quer-se existente, permanente, mesmo na ausência.
O Amor quer-se quente e fogoso, mesmo depois de anos, de meses, de dias. De horas. Querem-se horas que queimem bem, cuja digestão seja saborosa e cujo metabolismo esteja equilibrado, ainda que umas vezes melhor, outras mais lento.
O Amor quer-se aqui e agora, por mais anos que passem, por mais horas que sussurrem no coração de quem por cá anda.
O Amor quer-se permanente na certeza na impermanência. Na certeza da incerteza, na certeza de que não se sabe se amanhã continuamos juntos.
O Amor quer-se vivo e com brisas que arrefeçam a monotonia dos dias, dos acordares rápidos, lentos, esquecidos ou apressados.
O Amor quer-se capaz. Capaz de amar ainda mais, de sorrir e cambalear de paixão e emoção a cada história que passa, a cada capítulo construído. A cada página em branco que se vai preenchendo. Inebriante e sussurrante. De encantar, por encantar, em constante deleite.
O Amor quer-se contínuo e crescente, como que livro por acabar, cujas sequelas parecem infindáveis, cujos capítulos parecem preceder a algo sempre por preencher.
Por mais aconchegante que o tempo reconforte o Amor, este quer-se em lume brando, mesmo quando queima e dilacera bons momentos, inimagináveis. Mas que não se apague nem se mantenha em banho maria, mesmo quando brando. Que aqueça sempre. E que restaure.
O Amor quer-se sempre. E em tudo. Permamente na impermanência.

Mora
Fev. 2015


Friday, February 20, 2015

"as aparências apagaram-se"

Almonds Blossom, V. Van Gogh

 A Festa do Silêncio

Escuto na palavra a festa do silêncio.
Tudo está no seu sítio. As aparências apagaram-se.
As coisas vacilam tão próximas de si mesmas.
Concentram-se, dilatam-se as ondas silenciosas.
É o vazio ou o cimo? É um pomar de espuma.

Uma criança brinca nas dunas, o tempo acaricia,
o ar prolonga. A brancura é o caminho.
Surpresa e não surpresa: a simples respiração.
Relações, variações, nada mais. Nada se cria.
Vamos e vimos. Algo inunda, incendeia, recomeça.

Nada é inacessível no silêncio ou no poema.
É aqui a abóbada transparente, o vento principia.
No centro do dia há uma fonte de água clara.
Se digo árvore a árvore em mim respira.
Vivo na delícia nua da inocência aberta.

António Ramos Rosa, in "Volante Verde"


Wednesday, February 18, 2015

contos de fadas.

Agnieszka Szuba

"If you want your children to be intelligent, read them fairy tales.
If you want them to be very intelligent, read them more fairy tales."

Albert Einstein

Tuesday, February 10, 2015

atravessas...

atravessas o ermo,
junto àquele rio de cor de peixe,
onde escamas reluzem à sombra
do mais celestial brilho soalheiro
que o teu sorriso provoca ao acordar.

ei-lo, por fim. esse reluzir quase que fresco
de tanta brisa o percorrer,
com a suavidade de semear o amanhecer,
esse acordar, tão terno e aconchegante.

e com os primeiros raios que sorriem
pelos ramos das sombras brincalhonas,
com o sussurrar do vento de norte
que irrompe sem sequer se fazer notar,
até que acordas desse sono constante
de ternura e cafunés ao adormecer.

atravessas o sorriso
do mais discreto acordar,
do sono leve e profundo de quem
se deixou aconchegar,
de quem se escapou à insónia perturbante,
outrora vivida, agora distante.

sorris e fazes sorrir,
no terno abraço
desse corpo,
reluzente e ofuscante,
da cumplicidade deste mar ondulante.
 
Mora
 09-02-2015
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